Fellows... Este post da querida colega Simone Sá, lá da UFF, ficou tão bom que eu o chupei... vejam como ajuda a entender parte dos acontecimentos que estamos registrando aqui no blog... no caso, o recente fenômeno dos clips e spoof da série " vai tomar no..."
Já linkamos o blog do grupo da Simone, o LabCult, e sugiro que os mais acadêmicos passem por lá com freqüência. vale a pena...
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Stronda Music , por Simone Sá (do blog LabCult - http://labcult.blogspot.com )
Semanas atrás, recebi de uma aluna um arquivo musical inusitado. Era uma balada cantada por voz feminina, arranjos para coro e instrumentos, que poderia ter sido gravada por qualquer baladeira clássica dos anos 60. Poderia. Isto se a letra não fosse somente a repetição de uma mesma frase: o nosso famoso "Vai tomar no c.." - que causava um efeito hilário, quando combinada com os elementos acima mencionados.A mensagem comentava ainda qualquer coisa sobre usar a música como truetone para celular... o que me fez respondê-la rindo para depois esquecer da história. Até que hoje me deparei com a sua amplificação nas páginas da Revista - suplemento do Jornal O Globo - com matéria de duas páginas do jornalista Carlos Albuquerque.Sob o título "Deboche em rede", ele comenta esta "tendência", captando o espírito da coisa."Longe das gravadoras e apenas a um clique de distância do respeitável público, as músicas de João Brasil e da dupla Cris Nocoletti/Cacá Bloise e Prexeca Bangers estão tirando a maior onda na internet. São produções toscas, com jeito caseiro e 100/% iconoclastas, porque respeito é bom, mas eles não gostam."A partir daí, ele destaca a trajetória destas produções que têm em comum o escracho, a produção tosca, o descompromisso, a Internet como ambiente de circulação e o estouro a partir do boca a boca (ou clique a clique).Sobre a balada da dupla Cris e Cacá ele conta que foi feita numa noite de bebedeira com amigos, no espírito de total sacanagem com um vizinho que reclamava do barulho...E que daí foi tocada em rodas de violão, depois gravada para uma peça de teatro, a gravação vazou para a Internet, fizeram um clipe para o You Tube, depois já tocou em festa na Pista 3 (casa noturna de Botafogo - Rio de Janeiro)- na bola de neve que está se tornando o padrão de divulgação via redes digitais.Nesta batida, estas produções já estão ganhando um rótulo - "Stronda Music". E há gravadoras de olho na produção - que na matéria é associada ao estouro da banda Mamonas Assassinas, na década passada. Do nosso ponto de vista, o fenômeno aponta para mais pistas do que simplesmente a retomada do humor dos Mamonas. Uma delas, a que explicita a estética e as estratégias do digital trash. Este fenômeno foi discutido de forma pioneira no Simpósio de mesmo nome, idealizado e organizado pelo colega Vinicius Pereira no final do ano passado na ESPM, do qual participei e vai virar livro em breve. E que se desdobrou no blog que comentei outro dia.Fenômeno que, do meu ponto de vista, caracteriza-se justamente por este tipo de produção tosca, debochada, politicamente incorreta, low tech, que tem na paródia a sua marca mais forte. Que poderia ser pensada como "lixo cultural" - mas que aponta para uma apropriação criativa e irônica dos ícones da mídia ao mesmo tempo que explicita o modelo de circulação "viral" da informação no ambiente da Internet, a partir das ferramentas de compartilhamento tais como You Tube, My Space, Orkut, etc.Exemplos da "Cultura da Interface" - conforme denominou Steven Johnson na obra de mesmo nome. Pois, no argumento do autor, torna-se necessário perceber a estreita relação entre o mundo de excesso informacional e a necessidade de filtros que mediem a nossa relação com esta informação a partir de inúmeros pontos de vista. E onde este processo de colagem ou de corta e cola é fundamental, revelando estratégias que tentam responder às questões: “o que significa toda esta informação? Como ela se relaciona com a minha visão particular de mundo?”Este argumento nos leva a outro. O de que a “liberação do pólo da emissão” defendido por alguns autores tais como Pierre Lévy ou André Lemos como a marca da cibercultura não pode ser compreendida sem esta segunda noção de mediação ou interface. Ainda segundo Johnson: se estas práticas permeiam a nossa relação com o mundo contemporâneo em todas as mídias, a flexibilidade da informação digital faz com que este seja o universo quase natural destas “metaformas” cuja marca principal é o hibridismo. Neste sentido, a digital trash é elemento fundamental da cibercultura. E assim, o que pode parecer uma bobagem - lixo cultural sem "relevância social" maior, reveste-se de novos significados que merecem atenção, por traduzir o espírito desta nossa época.Uma outra pista interessante é a dos vasos comunicantes entre o digital trash e as mídias tradicionais. Reparem: faz parte do processo dar um rótulo para esta produção - Stronda Music; perceber "com que este som se parece" (como diz Simon Frith no seu livro Performing Rites) - no caso o som dos Mamonas Assasinas e assim reconhecer um potencial mercado para este consumo.Junto com isto, a matéria do Globo na seção comportamento identifica aí uma "tendência"... Neste processo, podemos reconhecer as estratégias e tensões discursivas dos agentes envolvidos em torno do processo de valoração, autoridade e legitimação cultural - inclusive nós mesmos ao escrevermos este post. Tema que, neste exato momento, estamos discutindo nas reuniões do LabCult, a partir das leituras de Bourdieu e Simon Frith.Hits do Stronda Music pra pescar na rede:Vai tomar no c... - Cris Nicolotti e Cacá BloiseBaranga, Supercool, Pau Molão e Cobrinha Fanfarrona - de João BrasilVivo para mulé, Barro, Cafetão e Filosofia do Playson -Prexeca BangersDicas de leitura:Cultura da Interface - Steven Johnson - Zahar Ed. RJ, 2001 Campo intelectual e prjeto criador - Pierre Bourdieu. In: Problemas do estruturalismo - Zahar Ed, RJ, 1968 Performing Rites - On the value of popular music -Simon Frith -Harvard Univ Press - Cambridge, Mass -1996
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